sábado, 26 de dezembro de 2009

MODELO



D. EUGENIO SALES

As celebrações natalinas chamam a atenção, de maneira eloquente, para a família. A extraordinária lição que nos vem da manjedoura de Belém nos apresenta a vida que nasce em um lugar bem constituído.
O calendário litúrgico inclui, nesta época do ano, a festa da “Sagrada Família, Jesus, Maria e José”, onde as virtudes que servem de ordenamento e alicerce à instituição são devidamente exaltadas.
Os direitos políticos de cada pessoa, vinculados ao exercício da cidadania, devem ser devidamente amparados pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Segundo a competência de cada um, todos os esforços convergem, portanto, para a família. Caso contrário, atraiçoam a missão de que se encontram investidos em favor do bem comum.
A dignidade humana tem suas raízes na liberdade que nos torna semelhantes a Deus. Segundo o uso que fizermos desse dom divino, nossos atos serão bons ou maus.
Somos, assim, responsáveis pelo nosso comportamento e dele daremos contas ao Pai. Durante nossa existência, constantemente, é posto à prova o reto uso do livre arbítrio, e a convivência doméstica a isso não foge.
Deus estabeleceu a comunidade conjugal e, entre seus deveres, está a geração dos filhos. Lemos no Gênesis (1,28): “Deus os abençoou e lhes disse: ‘Sede fecundos, multiplicai-vos. ’”
Ora, isso só poderá ocorrer através do ato sexual. Atribuir-lhe o pecado de Adão e Eva revela pobreza de raciocínio. Também mostra ignorância quem afirma ser a geração da prole a única finalidade dessa união.
Aberto à vida, esse relacionamento entre o homem e a mulher, no matrimônio, é algo nobre e santificador.
Diz o Código de Direito Canônico: “A aliança matrimonial (...) é ordenada, por sua índole natural, ao bem dos cônjuges, à geração e educação da prole.”
No entanto, assistimos, em graus diferentes, a constante e crescente ofensiva que tenta destruir a Família.
O drama dos menores abandonados passa por lares desfeitos. O estímulo ao sexo livre, por vezes, vem indelevelmente manchado pelo sangue dos fetos abortados.
Difunde-se a loucura de legalizar “famílias paralelas”. Diante de tantos problemas deste país, muitos dos nossos políticos se especializaram nesse campo. E não estão sozinhos...
Por outro lado, continua a destruição dos valores morais, essa trilha infeliz que nos leva ao precipício.
A esse respeito falou o Papa Bento XVI aos bispos do Brasil, dos regionais Nordeste 1 e 4, em visita ad limina, a 25 de setembro deste ano: “A família está assentada no matrimônio como instituição natural confirmada pela lei divina. Pondo em questão tudo isto, há forças e vozes na sociedade atual que parecem apostadas em demolir o berço natural da vida humana (...). Enquanto a Igreja compara a família humana com a vida da Santíssima Trindade — primeira unidade de vida na pluralidade das pessoas — e não se cansa de ensinar que a família tem o seu fundamento no matrimônio e no plano de Deus, a consciência difusa no mundo secularizado vive na incerteza mais profunda a tal respeito, especialmente desde que as sociedades ocidentais legalizaram o divórcio.”
Esse contraste merece uma reflexão maior e uma escuta atenta ao convite do santo padre: “Para ajudar as famílias, exorto a propor-lhes, com convicção, as virtudes da Sagrada Família: a oração, pedra angular de todo lar fiel à sua própria identidade e missão; a laboriosidade, eixo de todo matrimônio maduro e responsável; o silêncio, cimento de toda a atividade livre e eficaz, pois nos ensina o recolhimento e a interioridade, conduzindo-nos à vida de oração (cf. Paulo VI, ibidem). Tenho confiança no testemunho daqueles lares que tiram as suas energias do sacramento do matrimônio. É a partir de tais famílias que se há de restabelecer o tecido da sociedade.”

D. EUGENIO SALES é cardeal-arcebispo emérito da Arquidiocese do Rio.
(Publicado no Jornal "O GLOBO", no dia 26/12/2009)

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